terça-feira, 18 de setembro de 2012

VOOS REGIONAIS PODEM CUSTAR TRÊS VEZES MAIS QUE ENTRE CAPITAIS


 
Se depender dos preços dos voos regionais no Brasil, algumas cidades do interior do país continuarão acessíveis apenas por terra, a não ser que o viajante esteja disposto a pagar caro pela passagem aérea. Levantamento feito pelo O Globo constatou que um bilhete do Rio para Juiz de Fora, no interior de Minas, por exemplo, pode custar o triplo do valor pago por uma passagem da mesma origem até Belo Horizonte, mesmo considerando que a distância entre as capitais carioca e mineira é muito maior.
A pesquisa foi realizada em 10 e 11 de setembro para compra de passagens sem taxa de embarque entre os dias 20 (ida) e 23 (volta) do mesmo mês, mais de uma semana antes da decolagem. Enquanto o passageiro teria que desembolsar no mínimo R$ 758,32 para compra de um bilhete de ida e volta do Rio para Juiz de Fora pela companhia TRIP, o trajeto entre Rio e Belo Horizonte custaria R$ 224 pela mesma empresa.
Os voos operados pela TAM custam ainda mais. No mesmo trecho Rio-Juiz de Fora, os preços podem variar de R$ 1.051 a R$ 2.510, mais caros até que para extremos do Brasil, como Porto Alegre, onde foi possível encontrar, na mesma empresa, tarifas para ida e volta, saindo do Rio, por R$ 366.
Outro trecho que ilustra o custo maior dos voos regionais no Brasil é o que liga Rio a Governador Valadares, também no interior de Minas. O bilhete custa entre R$ 726 e R$ 2.508 pela TRIP e R$ 844 e R$ 3.500 pela TAM.
A relação não se restringe à rota Rio-Minas. Os preços dos voos do Rio para o interior paulista também são altos. Podem valer entre R$ 480 e R$ 654 para Bauru, pela GOL, e R$ 628 a R$ 748 para São José dos Campos, pela TRIP. Já para São Paulo capital, é possível achar voos entre R$ 200 e R$ 250, operados pela maioria das companhias aéreas do país.
A Bahia é outra região que não foge à regra. Saindo do Rio para Ilhéus, os voos de ida e volta somavam, nos dias pesquisados, entre R$ 780 e R$ 2.300 pela Avianca, e R$ 1.305 e R$ 2.007 pela Gol. Para Salvador os preços encontrados foram relativamente menores, podendo ser comprados pelo mínimo de R$ 389,19 pela Webjet.
Segundo o especialista em aviação e regulação Alessandro Oliveira, os altos preços cobrados são reflexo da baixa demanda. Como a companhia regional não consegue, em muitos casos, encher a aeronave, o custo de operação por passageiro-quilômetro é mais alto.
— O voo regional é muito específico. Pelo fato de ser de baixa densidade, concorre com o modal rodoviário. Muita gente faz o trecho de carro ou de ônibus — avaliou.
— Com o custo mais elevado, a companhia acaba repassando os valores para as passagens — acrescentou Oliveira, que também é ex-diretor de Política Regulatória da Secretaria de Aviação Civil do Ministério da Defesa e presidente-fundador da Sociedade Brasileira de Pesquisa em Transporte Aéreo (SBTA).
Outro problema, segundo o especialista, é a questão monopolista. — Com a baixa demanda, a companhia acaba sendo única e, por não ter concorrência, coloca o preço mais alto — explicou.
O analista em aviação e sócio da consultora Bain & Company André Castellini chama atenção para o tamanho das aeronaves. — As empresas regionais operam em aviões menores que são bem mais caras por assento. É como operar um ônibus ou uma van — exemplifica.
Outro aspecto ressaltado por ele são as promoções. — Dependendo da rivalidade que existe na rota, as empresas têm incentivo para fazer promoções fora do pico — disse ele, alertando, porém, para os resultados negativos que as empresas vêm registrando.
— Tem que tomar cuidado por que tem empresas que estão cobrando barato e não estão conseguindo cobrir os custos. Essa é a realidade da aviação brasileira, as empresas estão tendo prejuízos — disse.
Procurada pela reportagem, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) informou por meio de nota que não se posiciona sobre os preços das passagens devido ao princípio da liberdade tarifária para transporte aéreo doméstico, segundo o qual “as empresas podem estabelecer livremente as tarifas a serem oferecidas ao usuário na prestação de seus serviços”. O Sindicato Nacional das Empresas Aeroviárias (Snea) também disse que não se manifesta em relação aos preços. Já Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) se limitou a dizer que os preços dos bilhetes aéreos no Brasil custam em média hoje a metade do valor de dez anos atrás e que as rotas de aviação regional têm apresentado crescimento expressivo
 
INTERIOR DO BRASIL É MAIS CARO DO QUE PASSAGENS ENTRE PAÍSES DA EUROPA
 
Os preços das passagens regionais ficam mais assustadores quando comparados aos praticados para alguns destinos no exterior e na Europa. Com quase o mesmo valor gasto com uma passagem do Rio para Juiz de Fora, cuja distância é de 180 quilômetros, é possível voar da capital carioca até Buenos Aires, dez vezes mais longe. O preço mínimo de voo encontrado para a Argentina nos dias pesquisados foi de R$ 970.
E por muito mais barato é possível viajar entre os países europeus. No continente, compra-se passagens faltando apenas uma semana para o voo por cerca de R$ 300 entre as principais capitais como Paris e Roma, por exemplo, e até para outro continente, no caso de Madri, na Espanha, com destino para Marrakech, no Marrocos, no norte da África. Isso quando não há promoções e os preços caem para R$ 70 ou menos.
Os voos europeus mais baratos são operados pelas companhias Ryanair e Easy Jet que, na avaliação de Alessandro Oliveira, são exemplos no aproveitamento de aeroportos secundários. — As empresas montam operações a preços baixíssimos em aeroportos menores. O que era um deserto explode de tanta demanda — disse.
 
FALTA AEROPORTO TODO, E NÃO PISTA
 
O interior do Brasil carece de aeroportos preparados para operar voos regionais, segundo Alessandro Oliveira.
— Não faltam pistas pelo interior, temos muitas. O que falta é o aeroporto todo. Tem que ter manutenção, terminal, toda certificação garantida. Nem sempre os aeroportos estão preparados para usar jato, que seria o modelo low cost, por exemplo. Jato tem que acomodar, tem que ter o mínimo de requisitos de segurança, são 200 pessoas desembarcando — ressaltou.
Segundo ele, o Brasil só terá um mercado pujante quando tiver mais investimento em infraestrutura, para mais companhias operarem.
— Não tem espaço para algumas empresas e para novos voos. Ou as cidades arrumam novos aeroportos ou vão ter valores cada vez mais altos. É o preço que se paga para desenvolver o interior e integrá-lo ao restante do país — destacou.

(Fonte : Jornal O Globo)

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