quarta-feira, 15 de agosto de 2012

NOVAS CONCESSÕES TERÃO MENOR TAXA DE RETORNO


A taxa de remuneração dos investimentos privados nas novas concessões que serão anunciadas pela presidente Dilma Rousseff cairá para um nível entre 6% e 6,5% ao ano, no máximo, em termos reais. Serão, conforme destacam dois funcionários do governo com conhecimento do assunto, as taxas de retorno mais baixas da história recente do país para projetos de infraestrutura.
"É desse número para menos", confirmou um auxiliar da presidente, que tem participado das reuniões preparatórias do pacote de concessões, no Palácio do Planalto. As taxas de retorno dos investimentos, conhecidas no mercado como TIR, seguem uma trajetória de queda desde o primeiro ciclo de privatizações, na década de 1990, durante o governo Fernando Henrique Cardoso.
Os contratos de concessão das rodovias federais assinados naquela época, como o da Nova Dutra e o da Ponte Rio-Niterói, tiveram uma remuneração anual que variava de 13% a 21%. Em outubro de 2007, depois de uma orientação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para rever os estudos da segunda etapa de concessões rodoviárias, a taxa de retorno de estradas como a Fernão Dias (São Paulo-Belo Horizonte) e a Régis Bittencourt (São Paulo-Curitiba) caiu para 8,95%.
A única rodovia concedida até agora no governo Dilma, a BR-101 no Espírito Santo, teve uma TIR fixada em 8%. A taxa diminuiu ainda mais, para 6,46%, nos estudos que balizaram o leilão dos aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília. Segundo as fontes ouvidas pelo Valor, essa trajetória de queda reflete não só a maior previsibilidade da economia brasileira e a redução do custo de capital, mas também a estabilidade dos contratos, sem mudanças súbitas de regras pelas agências reguladoras.
Além de reduzir as taxas de retorno, o governo aumentará o nível de exigências para as futuras concessionárias de rodovias, que terão 25 anos de contrato e vencedores definidos pelo critério de menor tarifa de pedágio. A meta é antecipar os investimentos pesados. Todos os trechos com necessidade de duplicação de pistas - a BR-101 (na Bahia) e a BR-262 (Belo Horizonte-Vitória) - precisarão estar com obras concluídas até o fim do quinto ano de concessão. No trecho capixaba da BR-101, leiloado em janeiro e ainda sem o contrato assinado, a previsão era de duplicar as pistas até o 10º ano de contrato.
Quanto às taxas de remuneração, os auxiliares da presidente avaliam que o país está preparado para promover uma nova rodada de queda: o custo do financiamento pelo BNDES despencou - a TJLP, usada como referência para a maioria dos empréstimos, caiu para 5,5% ao ano -, a segurança jurídica está comprovada e as multinacionais interessadas nas concessões têm poucas oportunidades de negócios nos países ricos. Além disso, os estudos oficiais indicam crescimento da demanda nas próximas décadas.
Para um alto executivo do setor privado que foi consultado por ministros de Dilma durante os preparativos do pacote de concessões, uma taxa de retorno de aproximadamente 6% é "aceitável" na maioria dos projetos, mas precisa de uma contrapartida oficial: o aperfeiçoamento dos estudos que balizam os editais.
Esses estudos indicam, por exemplo, a expectativa de demanda em um projeto de infraestrutura e o volume de investimentos exigidos ao longo do contrato. A partir dos resultados, o governo fixa um valor de outorga ou uma tarifa máxima de pedágio, que se tornam referenciais para a taxa de remuneração do capital. Dependendo da proposta vencedora do leilão, a TIR pode aumentar ou diminuir, pois as concessionárias podem correr mais riscos ou considerar receitas subestimadas nos estudos.
De qualquer forma, segundo esse executivo, os estudos são a maior referência disponível para os participantes de uma licitação. Ele menciona casos em que o governo "errou a mão" nas projeções. No leilão do aeroporto de Brasília, em fevereiro, os estudos oficiais estimavam um fluxo de quase 53 milhões de passageiros/ano no pico da concessão. As empresas que participaram da disputa estimavam, no máximo, 44 milhões de passageiros/ano.
Outro caso emblemático remete aos cinco lotes de rodovias arrematados pela OHL, no leilão de 2007, em que a empresa espanhola ofereceu deságios superiores a 50% sobre as tarifas máximas de pedágio. Para fazer uma proposta agressiva, surpreendendo os concorrentes, a OHL estimou um fluxo de veículos que superava em até 131% as projeções da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
Curiosamente, a ANTT previa um fluxo de 151 milhões de veículos equivalentes (caminhões e ônibus contam mais do que automóveis) no último ano de concessão da Fernão Dias, em 2032. Para o espanto dos analistas, esse volume de tráfego foi atingido em 2011, no quarto ano de contrato.
O advogado Fernando Henrique Cunha, sócio do escritório FHCunha e especialista em infraestrutura, diz que as taxas de retorno propostas pelo governo requerem uma avaliação "caso a caso" e dependem do risco associado a cada projeto. Ele ressalta a importância, no entanto, da qualidade dos estudos. "Para chegar à taxa, precisamos de projetos consistentes. Isso dá ao proponente a possibilidade de analisar o quanto de risco ele está correndo."
Os trabalhos da Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP), responsável pelos estudos dos aeroportos leiloados em fevereiro e recém-contratada para analisar a nova rodada de 5,7 mil quilômetros de rodovias, foram criticados nos bastidores da Agência Nacional da Aviação Civil (Anac) e do Tribunal de Contas da União (TCU).
Para muitos setores do governo, porém, essa discussão é irrelevante. "O próprio mercado é capaz de corrigir as distorções nos estudos", disse um ministro.

(Fonte : Jornal Valor Econômico)

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