segunda-feira, 6 de junho de 2011

DECOLAGEM AUTORIZADA



O governo finalmente decide entregar seus aeroportos à iniciativa privada, mas a participação da Infraero nas concessões levanta dúvidas sobre o modelo adotado

Um inesperado anúncio chegou aos funcionários da Infraero na terça-feira 31, dia em que a estatal celebrava seu 38º aniversário. Em mensagem aos colaboradores, o presidente da empresa, Gustavo Vale, revelou a decisão do governo de privatizar três dos principais aeroportos administrados pela empresa: o de Cumbica, em Guarulhos, e o de Viracopos, em Campinas, ambos em São Paulo; e o Juscelino Kubitschek, em Brasília. Foi uma surpresa para o pessoal da estatal.
A sinalização, até então, era de que o novo modelo seria adotado para os novos terminais, com a concessão apenas das áreas comerciais. Mas a presidente Dilma Rousseff foi convencida pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) de que era melhor entregar à iniciativa privada toda a administração e exploração dos terminais. Agora, a Infraero será parceira obrigatória nas sociedades de propósito específico (SPEs), que serão criadas para administrar cada um dos três aeroportos.
Os detalhes ainda serão definidos nas regras do edital, que deve ser lançado em dezembro, mas já está decidido que o setor privado terá um mínimo de 51% do capital. A ideia é caracterizar a nova empresa como de capital misto e livrá-la das amarras da Lei de Licitações – na avaliação do governo, uma das principais razões da morosidade e ineficiência da Infraero. O ministro Wagner Bittencourt, da Secretaria de Aviação Civil, órgão criado para coordenar as obras do setor aéreo, acrescenta que o modelo “shopping center”, que se limita à concessão de espaços para a exploração comercial nos terminais, não garantiria o retorno financeiro para possíveis investidores.
“É preciso aproveitar a disposição de investidores, nacionais e estrangeiros, de fazer esse aporte no Brasil”, disse em audiência na Câmara dos Deputados, na quarta-feira 1º. Para o governo, manter a Infraero na administração dos aeroportos tornará a empresa mais atraente na hora de abrir seu capital, o que deve ocorrer até o fim desse governo. “É mais fácil abrir o capital da Infraero depois de se aplicar nela um choque de competitividade”, disse Dilma na reunião com governadores e prefeitos das 12 cidades-sede da Copa do Mundo de 2014, na terça-feira 31.
A participação da Infraero em cada empresa vai depender dos investimentos feitos pela estatal nesses aeroportos. Para a Copa do Mundo de 2014, Guarulhos deve receber R$ 1,2 bilhão; Brasília receberá R$ 748,4 milhões; e Viracopos, R$ 742 milhões. Parte dos recursos já foram gastos, mas a estatal ainda não tem os dados definidos. “A Infraero precisa recuperar seu investimento”, diz Vale, da Infraero. “Quanto maior for, maior será a participação da empresa no capital.”
As indefinições sobre o modelo a ser adotado têm deixado cautelosos possíveis investidores, entre empreiteiras e companhias aéreas. Empresas como Gol e Azul afirmam que estão acompanhando o assunto, enquanto a TAM não se manifesta. “A entrada da iniciativa privada é o ponto mais crucial”, disse à DINHEIRO Juan Quirós, presidente do Grupo Advento, especializado em grandes construções e interessado em Viracopos.“O investidor quer controle da gestão, e isso ainda não se sabe como será.”
Para o professor de transporte aéreo da Escola Politécnica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Respício do Espírito Santo, o grau de interesse das empresas nas concessões estará diretamente atrelado a sua autonomia nas decisões e em relação à Infraero. “É preciso saber até onde irá o poder do governo nessa SPE”, afirma.
O governo, no entanto, sabe que tem nas mãos um ativo atraente. Os aeroportos de Guarulhos, Brasília e Campinas estão entre os cinco mais lucrativos da Infraero. Juntos, lucraram R$ 456,6 milhões em 2010. Mas, como apenas 21 dos 67 aeroportos da Infraero estão no azul, mantê-los sob gestão estatal significa recursos para sustentar seus terminais deficitários. Se está claro como o governo ganha nessa equação, para o setor privado, ainda sobram dúvidas.

(Fonte : Revista Isto É Dinheiro / imagem divulgação)

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