segunda-feira, 11 de abril de 2011

TINTOS DA ÁUSTRIA TRAZEM ALGUMAS BOAS SURPRESAS



Os vinhos brancos da Áustria são os queridinhos dos sommeliers mais sofisticados do mundo há já alguns anos - mas estarão os bebedores de vinho prontos para os tintos austríacos? Em San Francisco, berço do vinho californiano, o "Chronicle" dedicou no mês passado um longo artigo sobre eles. E, em agosto passado, uma degustação às cegas foi realizada com os provadores mais competentes de Cingapura, que acabaram preferindo os pinot noirs austríacos a muitos famosos da Borgonha. Por isso, decidi pela primeira vez, na recente degustação genérica de vinhos austríacos em Londres - um evento realizado todos os anos no Institute of Directors (IoD) - ignorar os brancos produzidos no Danúbio e provar apenas tintos - em sua maioria produzidos ao sul e a leste de Viena, onde se dissemina o calor proveniente da Panônia húngara. Posso dizer que esses vinhos são fascinantes, pois minha velocidade de degustação parecia apenas cerca de metade da habitual, e acabei (pela primeira vez) sendo enxotada para fora da sala de provas pelos funcionários do evento, que ostensivamente recolhiam garrafas, copos, e baldes de gelo ao meu redor. Quanto à qualidade dos tintos austríacos em exposição no IoD, identifiquei alguns muito, muito entusiasmadores, mas, talvez, não o suficiente para que eu fizesse uma recomendação geral no sentido de que os amantes do vinho deveriam rumar decisivamente para a planície da Panônia em busca das emoções do vinho. Parece, efetivamente, valer a pena pagar algum extra pelo engarrafado por um único vinhedo, geralmente vendido por valores mais próximos de £ 20 do que de £ 10 a garrafa. Dito isso, notei em degustações genéricas em Londres que exportadores em potencial têm ouvido com tal frequência que o mercado britânico é perigosamente competitivo, e que os compradores de vinho britânicos são terrivelmente mesquinhos, que alguns tendem a não se preocupar em mostrar seus melhores vinhos. (Isso ficou evidente, por exemplo, na recente degustação inaugural de genéricos em Londres de - acreditem ou não - vinhos turcos.) O que a Áustria pode oferecer, porém, é um trio de verdadeiramente notáveis variedades de uvas tintas. Uma delas, a zweigelt, é capaz de produzir vinhos exuberantemente frutados que, em sua forma usual não armazenada em barris de carvalho pode proporcionar uma bebida encantadora por menos de £ 10 a garrafa. Uma boa introdução aos sabores da zweigelt é o da safra 2009 de Johanneshof Reinisch, admirado produtor da área chamada Thermenregion. Esse é um grande e ousado vinho que de alguma forma, tanto em sabor como em seu aspecto visual, violáceo - talvez porque pareça recheado com berries. Mas eu me surpreendi admirando dois exemplos muito mais sérios de zweigelt. O Girmer 2008 da K+K Kirnbauer é produzido a partir de vinhas zweigelt com 52 anos de idade cujas raízes atingem profundidades de até 25 metros sob o vinhedo em Mittelburgenland. Repleto de energia, foi envelhecido durante 18 meses em barris de carvalho plantados numa floresta de propriedade da mesma família, tornando-o um produto verdadeiramente local. Franz Leth, cujos vinhedos são cultivados nos profundos solos "loess" (um solo fértil de coloração amarela, formado por sedimentos depositados pelo vento) de Wagram, produz zweigelts particularmente notáveis. O modelo em que se baseia o Leth Klassik 2009, não envelhecido em barris de carvalho, são os tintos exuberantes produzidos na Áustria no final do século 20 com o uso de pequenos barris de carvalho. (Uma das razões pelas quais o momento pode ser perfeito para os tintos austríacos é que os vinicultores do país puseram fim a seu romance com as barricas e agora têm um relacionamento mais equilibrado com o carvalho). Leth também produz o talvez mais dramático zweigelt de todos, o Gigama, feito apenas em boas safras, com colheita tardia. Outro uva boa para tintos e a sankt laurent, cujas origens são obscuras, mas cujos vinhos são invulgarmente aveludados. Os vinhos tendem a ser voluptuosos e podem ser um pouco adocicados, faltando-lhes a estrutura e, talvez, a longevidade dos melhores pinot noirs austríacos. Novamente, Johanneshof Reinisch, da Thermenregion, apresentou um de meus exemplos favoritos: seu Holzspur 2004, quase um Côte-Rôtie, defumado e dotado de uma textura de cetim. É uma maravilha produzida a partir de vinhas de muito baixo rendimento plantada pelo avô do atual incumbente, Michael Reinisch. Em Burgenland, ao sul, às margens do Neusiedlersee (lago na fronteira com a Hungria), tanto Pittnauer como Umathum produzem belos sankt laurents. Mas a variedade de uva provavelmente mais propensa a colocar os tintos austríacos no mapa é a blaufränkisch, conhecida como kékfrankos do outro lado da fronteira, na Hungria, e lemberger, no sul da Alemanha e no Estado de Washington (EUA). Ele apresenta a mais atraente combinação (atualmente na moda) de vinhos semiencorpados do que encorpados e, um aroma refrescante e a capacidade de transmitir diferenças bastante sutis de terroir com precisão, ao menos na Áustria. A maior concentração do fascinante blaufränkisch fica em Burgenland, sendo que o vinho produzido em Leithaberg, na margem ocidental do Neusiedlersee, é tão nitidamente mineral que ganhou sua própria denominação de origem. Grüner veltliner pode ser ainda mais difícil de pronunciar do que blaufränkisch, mas seu sucesso em parte tem sido, provavelmente, devido à sua abreviatura frequente Gru-Ve, ou simplesmente GV. Temo ser improvável que uma boa sigla para o tinto austríaco.

(Fonte : Financial Times, com publicação no J. Valor Econômico / imagem divulgação)

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