segunda-feira, 22 de novembro de 2010

BRASIL AINDA SOFRE PARA ATRAIR TURISTA ESTRANGEIRO


Enquanto o gasto de brasileiros no exterior bate recordes seguidos, o Brasil ainda enfrenta dificuldades para atrair turistas estrangeiros.
Números do BC mostram que as despesas de brasileiros nessas viagens cresceram 230% nos últimos cinco anos, muito acima da expansão de 50% nas receitas obtidas com visitantes de outros países. A diferença, que gerava receita de US$ 350 milhões em 2004 ao país, provoca deficit de US$ 7 bilhões.
A taxa de câmbio, que torna o Brasil mais caro para estrangeiros e o exterior mais barato para brasileiros, é apontada por empresas do setor como o principal fator para essa diferença. Além disso, a crise global interrompeu o crescimento do turismo estrangeiro no país, verificado desde 2002.
Apesar da recuperação ante 2009, a receita com turismo estrangeiro neste ano segue abaixo do patamar verificado no mesmo período de 2008. Já os gastos brasileiros no exterior cresceram 30% ante o período pré-crise.
Turistas americanos e europeus, regiões mais atingidas pela crise, respondem hoje por 6% da ocupação de resorts no Brasil -era 30% há quatro anos.
"Essa participação já vinha caindo desde 2006 e agora chegamos ao fundo do poço. No Sul, o turismo argentino e chileno cobriu parte, mas Nordeste depende muito da Europa", diz o presidente da Resorts Brasil (associação do setor), Rubens Régis.
Para especialistas, o aumento das viagens de brasileiros no próprio país faz com que o setor não precise reduzir preços para atrair estrangeiros (como ocorre na América Central); outros entraves são burocracia, custos maiores e falta de voos diretos

Fluxo de remessas de filiais ajuda a manter o real valorizado

O caixa das empresas brasileiras tem sido reforçado por um fluxo recorde de remessas de dinheiro de suas filiais no exterior para o país, o que vem contribuindo para manter o real valorizado.
Essa tendência é nova e tem sido impulsionada por dois movimentos distintos.
Desde 2009, as subsidiárias de empresas brasileiras no exterior vêm aproveitando para quitar dívidas contraídas no passado com suas matrizes.
Mas as filiais têm ido além de pagar o que devem. Há cerca de três anos, iniciaram um movimento até então incomum no mundo dos negócios globais e vêm fornecendo empréstimos às suas próprias matrizes no país.
Somados todos os fluxos financeiros de matrizes para filiais e vice-versa entre janeiro e setembro deste ano, restou um saldo positivo de US$ 11,4 bilhões para o Brasil. Os dados são do Banco Central, que não divulga os nomes das empresas envolvidas nessas operações.
Esse movimento de remessas líquidas em operações de crédito de subsidiárias para as matrizes no Brasil é recente. Desde o início da série histórica do BC em 1999, isso ocorreu apenas em 2007 e em 2009, e volta a se repetir, com maior força, em 2010.
Do recorde de US$ 15,3 bilhões que as filiais enviaram para o Brasil entre janeiro e setembro de 2010, US$ 11 bilhões vieram para cobrir amortizações de dívidas assumidas com as matrizes, principalmente de 2007 a 2008, quando a crise financeira global levou a um colapso do mercado de crédito em países desenvolvidos.
Outros US$ 4,3 bilhões remetidos pelas subsidiárias para o país nos primeiros nove meses deste ano se referem a empréstimos concedidos às matrizes.

JUROS ATRATIVOS

Segundo analistas ouvidos pela Folha, a conjuntura econômica doméstica e a internacional ajudam a explicar as novas táticas empregadas pelas multinacionais brasileiras para administrar seus caixas.
Com a explosão da crise financeira global, os juros em países desenvolvidos -cujas economias se recuperam em ritmo lento- têm sido mantidos em patamares historicamente muito baixos.
No Brasil, por outro lado, a taxa básica de juros está em 10,75%, nível que continua muito elevado para padrões internacionais.
Isso pode estar funcionando como um incentivo para as subsidiárias de multinacionais brasileiras mandarem eventuais sobras de caixa ou recursos levantados a custos mais baixos lá fora para suas matrizes.
"Com o excesso de liquidez nos países desenvolvidos, as empresas conseguem se financiar de forma mais barata lá fora. Isso pode explicar esse fluxo de recursos financeiros de filiais para matrizes", afirma Mauricio Molan, economista sênior do Santander.
Para analistas, é provável que pelo menos parte dos recursos enviados por filiais para matrizes brasileiras tenha como destino investimentos no mercado financeiro doméstico.
"É muito provável que esses recursos tenham como destino investimentos financeiros aqui, para lucrar com os juros altos", diz Rita Mundim, professora da Fundação Dom Cabral.
Segundo Antonio Corrêa de Lacerda, economista e professor da PUC-SP, os números do Banco Central mostram que está em curso uma mudança na forma em como as multinacionais operam seus caixas.
"As empresas estão reposicionando seus fluxos de caixa em função da crise global", afirma.

Investimento produtivo no exterior cresce

A combinação de real valorizado e crise nos países desenvolvidos tem levado a uma aceleração do processo de internacionalização de empresas brasileiras.
De janeiro a setembro, os investimentos produtivos de empresas brasileiras no exterior atingiram um valor recorde de US$ 17 bilhões, segundo dados do BC.
Esse foi o montante que deixou o país com a finalidade de adquirir ou aumentar a participação no capital de companhias no exterior.
Com real forte e ativos à venda a preços baratos no exterior, empresas brasileiras têm aproveitado para se expandir além das fronteiras, segundo especialistas.
"Hoje é possível comprar ou aumentar a participação em empresas lá fora por valor muito mais barato em reais do que no passado", afirma André Sacconato, da consultoria Tendências.
Vultosos empréstimos do BNDES para criar grandes "campeãs" nacionais também têm contribuído, diz.
Para Antonio Côrrea de Lacerda, da PUC-SP, o retorno dos investimentos produtivos direcionados a países ricos só ocorrerá no longo prazo, por conta da persistência de um processo lento de recuperação no mundo desenvolvido.
Por isso, embora estejam expandindo operações no exterior, multinacionais brasileiras têm evitado aplicar sobras de caixa lá fora, o que vem alimentando a tendência de empréstimos de recursos para matrizes.
Para Rita Mundim, da Fundação Dom Cabral, o real forte tem provocado um "êxodo das bases operacionais" da indústria brasileira. Mas o baixo custo do capital lá fora e os altos juros domésticos têm feito filiais enviarem recursos.

(Fonte : Jornal Folha de S. Paulo)

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